Pascal


Assim, a vida humana não passa de uma ilusão perpétua: não se faz outra coisa que não seja enganarmo-nos e lisonjearmo-nos uns aos outros. Ninguém fala de nós na nossa presença como fala na nossa ausência. A união que existe entre os homens baseia-se apenas neste logro mútuo; e poucas amizades subsistiriam se cada qual soubesse o que o seu amigo diz dele na sua ausência, embora fale então sinceramente e sem paixão.
O homem não é, portanto, senão disfarce, mentira e hipocrisia, para consigo mesmo e para com os outros. Não quer que lhe digam a verdade. Evita dizê-la aos outros. E todas estas atitudes, tão afastadas da justiça e da razão, têm uma raiz natural no seu coração.



em Pensamentos, tradução e notas de Américo de Carvalho, Mem Martins: Publicações Europa-América, 1988, pp. 56-57.