o dia era
uma borboleta que os caiadores encontraram próximo dos chapéus como uma
lamparina de álcool acesa no movimento das aves hoje
— sexta-feira —
a ilha deixou o telefone do tempo impedido aos operários que são
os manipuladores exactos dos relógios
o sol é uma manivela automática que se diverte sobre o mapa da
sociedade e depois vai lavar os membros na geometria das sanitas é um calendário de fígados amarelos com
um sintoma de raiva morrendo a cada instante junto dos jornais que os mendigos
embrulham a comida com fome de cadáveres nos dentes e fora dos muros da cidade os sinos cavam
salmos nas oficinas de merceeiros e sapateiros os rostos quase plásticos escapavam ao
peso da insulina e dos êmbolos que fazem funcionar em qualquer sentido o
destino do corpo porque a morte repousa na fadiga dos habitantes e na mesma
mesa do pobre com bolor no pão a saber a gás carbónico
por cima de todas as viagens o sol embriagado de anis corria aos
metros as gargantas até largar a loucura dos cabelos na lama das ruas e nos
trabalhos humildes das nossas mãos
de galope em 4 esporas (1976) inserido em Sempre disse tais coisas esperançado na
vulcanologia – 12 poetas dos Açores, Organização e notas de Emanuel Jorge
Botelho, posfácio de Luís de Miranda Rocha, s/l: Gota de Água/Imprensa
Nacional-Casa da Moeda, 1984, p.111.