Segredo mais íntimo
Invade meu amor a noite antiga,
a memória eficaz, a derradeira
bem-aventurança,
sagaz querela, esperança
de reaver os frutos que ofertei,
tão disponível, como o fim do dia
cerrado aos prazeres habituais.
Fugaz, como a lembrança
de outras idades sepultadas mais,
junto de ti eu quero ter-me nelas,
vivo e literal,
reajustável ao sentir nascido
de uma criança que, sem ter morrido,
reapareceu criança igual a si.
Invade meu amor a noite antiga.
Retoma o teu lugar entre os demais
vultos que te desassossegam.
O que não sabes ter celebra ainda
a festa deslumbrante
que foram teus secretos esponsais.
em Corpo – Alma, Lisboa: Editorial Presença, 1ª edição, 1994, p.48.