São
vinte e quatro os poemas que compõem Caderno
de Milfontes (Volta D’ Mar, 2011). O
ponto de partida é dado pelos versos de João Miguel Fernandes Jorge e de Rui
Reininho/GNR: «Costa atlântica é sempre inevitavelmente». Para Rui Almeida (1972)
escrever poesia parece ser algo de inevitável, porque, em certa medida,
necessário. Talvez na poesia se encontre a resposta: «Como será limpar o rosto depois de Agosto?» (p. 9).
Um
segundo livro de poesia é esperado sempre como um segundo livro de poesia. Ora Caderno de Milfontes é o segundo livro
de poemas de Rui Almeida, no entanto, podia ser confundido como sendo o
primeiro. Explico: no seu verdadeiro primeiro livro, Lábio Cortado (Livrododia, 2009, Prémio Nacional de Poesia Manuel
Alegre), Rui Almeida surpreendeu tudo e todos com uma voz forte e avessa a
certos tiques que proliferam na actual poesia portuguesa. Em Lábio Cortado podemos encontrar uma
poesia tensa, amadurecida. Em Caderno de
Milfontes, encontramos uma poesia no limite, frágil, luminosa, assente nos
sentidos: «Subisse o mundo até à
visão,/Até ao rumor da maravilha,/Até aos braços/Que seguram a forma de ser
feliz» (p. 10). São estas as principais características que me levam a
pensar que Caderno de Milfontes podia
muito bem ser uma primeira obra, uma obra inicial e iniciante (e que não
envergonharia, de nenhuma maneira, o autor).
Em
Caderno de Milfontes Rui Almeida
explora a potencialidade de cada palavra, de cada verso: «Ascende ao presente a vaga/Firmeza aplicada ao que sucede,/Distracção
do tempo/Assumida em palavras sobrepostas/Para construir um nome.» (p. 12).
Há, nestes poemas, um tom telegráfico onde se procura dizer tudo em poucas
palavras: «Entre a espera e o cerco/Há a
intenção da demora/Para habituar o movimento/À forma estável.» (p. 16). Mas
são os sentidos (tacto, visão) que mais presentes estão nestes poemas. Podemos
falar de poemas do corpo e para o corpo: «A
firmeza do tacto,/A permanência das mãos/Para além da pele,/Deixadas, sem
acaso,/A fazer caminho/De tensões e aberturas/Dos músculos ao ar limpo/Que os
sustém.» (p. 25).
Socorro-me
das palavras de Italo Calvino – ao referir-se à poesia/escrita de Tonino Guerra
– para melhor tentar “concretizar” a experiência que foi a leitura da poesia
que podemos encontrar neste Caderno de
Milfontes: todos os poemas, neste livro, são experiências precisas,
concretas e inesperadas; neles há um sentimento e um tom de voz que nos fala,
porque é necessário guardar, salvar os melhores dias: «Salva-se agora/O que um dia será impossível.» (p. 31).
Rui Almeida, Caderno
de Milfontes, Nazaré: Volta D’ Mar, 2011, pp. 33.
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