Hino à vida
A franja do teu cabelo
mexeu-se de
repente.
De repente algo se mexeu no chão.
As árvores
sussurraram no
escuro.
Os teus braços nus irão ter frio.
Ao longe
onde a nossa vista
não alcança,
a lua está a
nascer.
Ainda não chegou até nós,
deslizando por
entre as folhas
para te
iluminar os ombros.
Mas sei
que com ela vem
um vento.
As árvores sussurram.
Os teus braços nus irão ter frio.
Lá do cimo,
dos ramos perdidos no escuro,
algo caiu a
teus pés.
Aproximas-te de mim.
A tua carne nua na minha mão é suave
como a pele do pêssego.
Não é uma canção ou “senso comum”,
perante as árvores, pássaros, e insectos
a minha mão na carne da minha
mulher
está a pensar.
Esta noite a minha mão
não consegue
ler ou escrever.
Não é amar ou desamar…
É a língua dum leopardo numa
fonte,
uma folha de
videira,
a pata dum
lobo.
Mexer, respirar, comer, beber.
A minha mão é como uma semente
deitada à
terra.
Não é uma canção ou “senso comum”,
nem amar ou desamar,
a minha mão na carne da minha
mulher
é a mão do
primeiro homem.
Como uma raiz
que encontra água,
diz-me:
“Comer, beber,
frio, quente, combate, aroma, cor ―
não é viver
para morrer
mas morrer para
viver…”
E agora
enquanto o seu cabelo ruivo
acaricia o meu rosto,
enquanto algo de repente se mexe
no chão,
enquanto as árvores sussurram no
escuro,
e enquanto a lua nasce ao longe
onde a nossa
vista não alcança,
a minha mão na carne da minha
mulher
perante as árvores, pássaros, e
insectos,
quero o direito à vida,
do leopardo na fonte, da semente
deitada à terra ―
do primeiro
homem.
Nazim Hikmet, «Hymn to life», Poems of Nazim Hikmet, traduzido do Turco por Randy Blasing e Mutlu Konuk, New York: Persea Books,
2002, pp. 72-73.
Sem comentários:
Enviar um comentário