O meu pai teve a sorte de cumprir o serviço militar em Alverca, numa altura em que os rapazes da idade dele iam para as ex-colónias. Em Fevereiro de 1968 o meu pai estava em Alverca. Foi mobilizado para socorrer as vítimas das cheias. Só o ouvi falar disso duas vezes. E dessas duas vezes há dois episódios que me ficaram na memória. O primeiro refere-se à incapacidade do meu pai, e dos seus companheiros, de salvar quem gritava na noite, quem pedia ajuda no meio do escuro, no meio da corrente forte que as levava. O segundo episódio contou-me o meu pai ainda há pouco tempo. Passado uma semana das cheias o meu pai andava num grupo destacado para limpar a pista aérea da base de Alverca. No meio da lama é encontrado um corpo: uma jovem rapariga abraçada a um tronco de árvore. As cheias de 1968 foram há 40 anos. O número total de mortos ainda hoje é incerto. Na televisão passou um documentário. Sei que o meu pai não o viu.
Uma noite que nunca mais acabava
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2 comentários:
O meu pai, duplo azar dele que era ferozmente contra a guerra, teve que ir bater os costados na Guiné (72/74)
E nunca mais falou disso. Não se lhe arranca uma palavra sequer.
conheço vários ex-combatentes que não falam sobre o assunto. já outros... são uns basófias
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