Quarto Escuro #2

Os primeiros textos que escreveste eram plágios descarados de outros textos. Procuravas encontrar a tua voz neles, mas só encontravas a voz dos outros repetida até à exaustão. Ainda hoje não sabes se algum dia encontrarás a tua própria voz. Parece algo de irrealizável, sem qualquer hipótese de sucesso. A tua voz estará sempre misturada com a voz dos outros que te antecederam. Cedo ficaste a saber que era assim, que ninguém é verdadeiramente original, que tudo é uma repetição de tudo, uma repetição de nada. E quando escreves recordas sempre isso. Nessas alturas apetece-te desistir. No entanto, sabes que não serias capaz de o fazer. É-te impossível deixar para trás tudo isto, apesar da dor ser intensa. Sim. Escrever é doloroso, mas necessário. Todos os dias escreves. Todos os dias a dor é intensa. Não há nada que possas fazer para a diminuir. Experimentaste tudo. Nada funcionou. O único remédio é continuar a escrever, aguentar a dor. Mesmo sabendo que tal nunca vai acontecer. Então para que insistir? Para que continuar? Por muito que penses não consegues explicar a razão. Só sabes que a necessidade de escrever supera a vontade de parar. Só sabes que sem escrever, sem dor, não és tu. Tu: que nunca foste mais que um conjunto de ideias, frases, emoções roubadas. Quantas vezes para falar do amor e da morte, falaste do amor e da morte dos outros?

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