Quarto Escuro #1
Até que um dia alguém desiste
do jogo e acende a luz.
Alguém decide que é melhor escrever.
José Ricardo Nunes
Passas a vida inteira a ler os outros. Tentas decifrar tudo isto. Nada dizem. Apenas prolongam as sombras, as dúvidas, pois nenhuma questão obteve alguma vez resposta. Começas a escrever. Procuras nas palavras alguma pista, algo que te indique o caminho. Também elas te deixam. É então que percebes que de pouco ou nada serve continuar. Mas não consegues parar. É impossível parar. Não há nada a fazer. Iniciaste um movimento que será perpétuo, que para sempre te acompanhará. Quer tu queiras ou não. Há dias em que as palavras surgem do nada, apanhando-te de surpresa. Tu escreves freneticamente. Os teus dedos percorrem o teclado com vontade própria, como se toda a vida não tivessem feito mais nada. No final estás exausto. Dói-te a cabeça, tens os olhos raiados de sangue. Levantas-te e vais até à casa-de-banho. No espelho há uma imagem reflectida que não reconheces. Talvez um pouco de água na cara ajude. Durante uns segundos sentes a sua frescura. Voltas a ser tu. Parece que tudo passou.
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