Homens


Posso dizer que estou a ter um fim de tarde calmo. Hesito entre pensar ou limitar-me a estar. Mas penso. E continuo a tentar pensar, isto é: convencer-me, que o Homem é um ser bom. Só que ligo a televisão e sintonizo o Canal História. Há um documentário sobre o Darfur e todas as minhas tentativas para readquirir fé nos Homens desaparecem. O Darfur passou-nos ao lado. Como nos passou ao lado o Ruanda: em três meses foram mortas 800.000 pessoas. Tive um aluno no Estabelecimento Prisional de Caxias que era do Ruanda. Pertencia à etnia dos tutsis. Fez os 24 anos na prisão. Antes tinha estatuto de refugiado da ONU e vivia na Holanda. Mas parece que o dinheiro ao fim do mês não era suficiente. Decidiu ser “correio”. Foi detido no aeroporto da Portela, quando regressava do Brasil com alguns quilos de cocaína. Um dia perguntei-lhe sobre o seu país e sobre o que se tinha passado. Ele falou-me da barbárie. Disse-me que eram todos vizinhos, todos amigos. Um dia de manhã acordou e estavam todos a matar-se uns aos outros. Ele só teve tempo de se esconder, fugir. Perdeu a família toda.

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