Duas pequenas notas e não volto mais a estes assuntos (12)


1. Todos aqueles que pensam um pouco sabem que este país, apesar de ser uma democracia, sofre de défice democrático. Como todos os que pensam sabem que é muito difícil lidar com as opiniões dos outros. Eu próprio, às vezes, tenho dificuldade em lidar com a opinião dos outros. No entanto, todos os dias tento contrariar esta minha atitude, que – apesar de poder ser reprovável – é o que me distingue do resto dos animais (sejam eles racionais ou irracionais). Outro problema é a posição política: esquerda ou direita. Quase ninguém é desassociado destes dois rótulos. Se criticamos a direita é porque somos de esquerda (ou não somos o suficiente de direita); se criticamos a esquerda é porque somos de direita (ou não somos o suficiente de esquerda). Resumindo: uma crítica nunca é vista como apenas uma crítica, mas – quase sempre – como um ataque pessoal. Tal como um texto de opinião nunca é visto como um texto de opinião, mas sim como uma crítica.

2. A questão da interpretação de textos – nomeadamente literários – foi algo que sempre me intrigou. Ainda hoje considero que se trata de uma ciência oculta, apenas possível a um grupo restrito de pessoas, que pertencem a uma sociedade secreta. É claro que não há nada de mais subjectivo do que a literatura. Cada um lê o que quer ler – e aqui também incluo os decretos-lei. Todo o texto literário é passível de infinitas interpretações. O consenso quase nunca é conseguido. É claro que esse é, quanto a mim, o principal valor do texto literário: o facto de não ser consensual. Um bom texto literário não deve ser consensual. Não quero com isto dizer que um texto que reúne consenso não seja literário. No entanto, desconfio dele.

Sem comentários: