«A verdadeira obra de arte não tem autor: ignora-se tudo da vida de Homero, exactamente porque os poemas nos satisfazem de sobremaneira. Não é o indivíduo que escreve, mas um espríto impessoal. Assim se rejeita, depois do factor realista, o da psicologia individual: não é nem o referente, nem o autor que fazem da obra aquilo que ela é.»
Tzvetan Todorov, Os Géneros do Discurso, Lisboa: Edições 70, 1981, p. 31.
4 comentários:
Não é o autor, mas foi. Nunca poderemos dissociar a poesia de Camões, lírica ou épica, da vida que Camões teve e que o marcou psicologicamente, como também não podemos deixar de enquadrar a poesia de Pessoa nele mesmo, empregado modesto de escritório numa Lisboa "provinciana", que não podia conter o seu génio, mas conteve, marcando assim a sua poesia de modo inconfundível. As obras de ambos, ao contrário do que afirma Todorov, estão marcadas por um espírito, que é não só profundamente individual, mas também individualizável com muita facilidade.
Não nego a importância que a vida possa ter na obra de arte. No entanto, quando leio um poema ou aprecio um quadro, pouco me importa a vida de quem o criou. E concordo com Todorov quando este diz que «não é nem o referente, nem o autor que fazem da obra aquilo que ela é». Acredito que a arte existe por si só, tal como a poesia. Como também acredito que a vida propõe à arte mil hipóteses de significação, mas é a arte que determina, que decide, aquelas que, de facto, significam (Vergílio Ferreira).
A questão estava em Todorov. O que ele afirma é uma generalidade bastante refutável e não uma verdade axiomática, até porque, quanto a mim, as verdades desse tipo são falsas. Se não é o referente nem o autor e as suas circunstâncias que tornam (ou fazem) possível a obra de arte ser o que é, então quem será? O leitor, o fruidor? O que Todorov afirma parece-me contrário àquilo que Virgílio Ferreira quer significar. E falando de perfeição em abstracto e pensando em génios e grandes talentos, ou, se quiser, em grandes obras, parece-me, pela experiência de as fruir, que essa arte é tão mais próxima daquilo que os autores quiseram expressar, na sua complexa gestação, quanto afastada é de segundas leituras, sempre redutoras do referente.
Caro nd:
como disse no título do post é uma coisa que me deixa a pensar. Não sei se aquilo que Vergílio Ferreira diz é assim tão contrário àquilo que Todorov diz. não sei, nem tenho argumentos para (e desculpe a repetição) argumentar. Mas numa coisa penso que estamos em acordo: as verdade. Não acredito nelas, nem dirijo a minha vida através delas. A verdade para mim é um enigma. Espero continuar a merecer a sua leitura e os seus comentários. Quanto a mim: fico-me por aqui.
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