A Moral já não é o que Era


De todos os novos autores de Língua Portuguesa, Gonçalo M. Tavares (1970) é aquele que melhor consolidou o seu lugar no panorama literário português. Para além de inúmeros livros publicados num curto espaço de tempo (23 entre 2001 e 2007), que vão do romance à poesia e do ensaio ao teatro, Gonçalo M. Tavares cedo estabeleceu o seu percurso, isto é, o seu “programa” de escrita. Prova disso é a divisão feita pelo autor da sua obra publicada até à data: O Bairro, Canções, Enciclopédia, Bloom Books, Poesia, Estórias, Teatro, Investigações e O Reino (tetralogia composta por Um Homem: Klaus Klump, A Máquina de Joseph Walser, Jerusalém e Aprender a rezar na Era da Técnica).

Aprender a rezar na Era da Técnica encerra em si um homem: Lenz Buchmann. Lenz Buchmann é um inadaptado dos dias em que vive, dias pobres e fracos. Lenz acredita na Força. Lenz Buchmann é um homem da Era da Técnica, desempenha uma profissão técnica (é cirurgião) e pouca importância dá à espiritualidade, à moral, que vê como elementos perturbadores de uma Sociedade que se quer forte. Mas Lenz é também um homem dominado pela figura do Pai (que nunca chega a “matar”), principal responsável pela Força de Lenz: «- Nesta casa o medo é ilegal» (p. 91). Um pai que se suicida aos 58 anos, no momento em que começa a sentir o seu declínio físico. A ideia de corpo continua presente neste romance como nos anteriores. Um corpo que é limitado, que a determinada altura deixa de cumprir a sua função.

Gonçalo M. Tavares é um escritor de ideias. Os seus romances são romances de ideias, de problemas. Em Aprender a rezar na Era da Técnica o conflito existente é evidente: como viver num mundo em que a Moral, e as decisões morais, são ultrapassadas pela Técnica, e pelas decisões técnicas? Como “rezar” num mundo que viu o seu centro unificador alterado? A Técnica tomou conta dos dias que são nossos, tomou conta da nossa maneira de pensar e agir. É mais imoral mentir ou não conhecer o novo Windows Vista? O Divino deixou de fazer parte das nossas vidas. É mais importante que a água continue a correr nas torneiras: «Se os crentes, ou os próprios padres, fizessem greve isso seria bem menos significativo e visível numa cidade do que uma greve de canalizadores ou electricistas. A boa circulação da água ou da electricidade torna-se, para o dia-a-dia, bem mais indispensável do que a boa circulação do sopro divino.» (p. 217). Evidente, não é? Mas será assim tão evidente?

Uma coisa é certa: todos nós temos um pouco de Lenz Buchmann dentro de nós. Esta é uma das mais valias da escrita de Gonçalo M. Tavares: confrontar-nos com os fantasmas que constantemente recusamos aceitar.


Gonçalo M. Tavares, Aprender a rezar na Era da Técnica, Lisboa: Caminho, 2007, 383 pp.


1 comentário:

Anónimo disse...

Pena é que seja uma mera reciclagem barata das ideias dos outros. Pena é que quem diz que leu muito livro, não os tenha lido de verdade - poupavasse à figuraça de palaço a dizer essas baboseiras todas sobre o GMtavares. Credo! Cruzes-canhoto ...