Quarto Escuro #7

Esperas que a noite chegue. Que doa. Falta-te um refúgio, um corpo que possas habitar, partilhar as sombras. Nunca conseguiste sozinho enfrentar a noite, os seus exércitos. Durante muito tempo só sabias deles através dos livros que lias. Até ao dia em que chegaram e passaram a dominar. Foi nessa altura que começaste a vaguear pelas ruas à procura de corpos disponíveis. Não foi difícil. Ficaste a saber que a noite não te doía só a ti. Havia corpos cujos olhos revelavam o medo. Eram esses que tu escolhias. As sombras afastavam-se, derrotadas pela união. Mas rapidamente regressavam, em maior número e força. Nada podia ser feito para detê-las. E a dor era mais forte, a batalha mais violenta, as feridas mais difíceis de sarar. Um dia escreveste que os corpos eram o segredo mais bem guardado da noite. Essa mesma noite que de novo tenta adormecer-te as mãos, impedindo o combate, a escrita dos fantasmas. Tentas resistir aos seus ataques. Tudo parece inútil. As mãos tremem, vacilam. A noite parece ganhar cada vez mais terreno. É então que gritas e o teu grito ecoa como uma oração. Mas ninguém te ouve ou vem em teu auxílio.

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