Saí de casa aos quinze anos. Melhor: fui estudar para a Guarda aos quinze anos. Mas o que eu quero mesmo dizer é que a partir dos quinze anos passei a gerir uma semanada, que até esse momento não passava de uma ideia demasiado distante. A semanada que me foi outorgada (sempre desejei utilizar esta palavra num texto) era, em 1992, de 2.500$00. Esta quantia oferecia-me uma certa autonomia financeira, e digo certa pela simples razão de continuar a depender exclusivamente da CP (=Casa dos Pais). A semanada era atribuída consoante as necessidades: 1000$00 para dois bilhetes de autocarro, 1000$00 para uma emergência e 500$00 para um ou outro luxo. A alimentação estava incluída na mensalidade paga à residência de estudantes que frequentava. É claro que com o passar dos anos a semanada era actualizada, não de acordo com a inflação, mas sim com o sábio discernimento dos meus pais. Quando entrei para o Ensino Superior a semanada passou a ser de 5000$00 por semana, o que dava: 1000$00 para dois bilhetes de autocarro (tive sorte, o bilhete quase nunca aumentava), 2000$00 para uma emergência, e 2000$00 para luxos. Esta nova semanada dava-me uma cada vez mais independência financeira, embora sempre vinculada à CP (= Casa dos Pais), pois ainda dependia dela para comprar roupa, CDs, e comer. Só com os meus 23 anos é que recebi o meu primeiro salário digno desse nome, pois até então tinha recebido algum dinheiro em pequenos trabalhos de verão. A partir desse momento a minha independência e autonomia passaram a ser completas. Excepto numa coisa: cuecas. Com o salário que passei a auferir (outra palavra que sempre desejei utilizar num texto) passei a comprar roupa, CDs, comida. Mas nunca cuecas. Em sete anos de trabalho nunca comprei um par de cuecas. Isso ainda é da exclusiva e única responsabilidade da CP (=Casa dos Pais). Por mais que eu queira comprar um par de cuecas, não consigo. Quando chega a altura certa encontro sempre a gaveta lá de casa com cuecas novas. Sou independente em tudo, menos em relação às cuecas. Penso que não há nada mais humilhante do que uma pessoa despir-se em frente de uma mulher sabendo que as cuecas, que ela acaba de elogiar, foram compradas pela nossa mãe. É terrível! Eu nunca deveria ter adquirido a minha independência financeira sem antes ter adquirido a minha independência relativamente às cuecas. Devia ter sido a primeira coisa a fazer quando recebi o meu primeiro salário: comprar cuecas novas e demarcar logo a minha posição. Mas não! Decidi antes comprar um número considerável de livros e CDs! E agora, sempre que me dispo à frente de uma mulher, ela elogia cuecas escolhidas pela minha mãe. Quem tiver a ler este meu texto pense duas vezes antes de comprar um livro ou um CD. Não se esqueçam: a leitura e a música alargam os nossos horizontes, mas são as cuecas que nos dão a total e completa independência.
A importância das cuecas
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6 comentários:
Homens modernos...
Homens modernos...também digo o mesmo!
Maria João
Manuel...
Acho que nunca mais vou comprar livros e CD's da mesma maneira!
Já não me chegava a angústia da escolha; agora ainda vou pensar se não aplico melhor as economias numas cuecas novas...´
Pensando bem, olhando para os escaparates das nossas portugas livrarias...há muitos livros que perdem para umas boas e confortáveis cuecas de algodão.
Sem costuras.
De preferência.
As minhas deixaram de ser compradas pela CP directamente para a namorada. 2 problemas resolvidos :P
Gosto dos textos e da forma como estão escritos. bom blog!
És o orgulho da nossa família DOMINGOS, mas...essa das cuecas deixou-me a pensar poque nós somos mais prácticos não utilizamos CUECAS...que se passa contigo?
Assassinado:
Ana Domingos,
Gonçalo Domingos e
LD & LD P.
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