Eu quero uma cara como a do Brad Pitt


Vi ontem um programa na VH1 que me deixou perplexo. Chama-se: I want a celebrity face, ou coisa parecida. As pessoas chegam lá e dizem que se querem parecer com este ou aquele. Hoje eram dois gémeos que queriam ser parecidos com o Brad Pitt. Alegaram que não tinham sucesso com as raparigas e que se achavam feios e que depois das plásticas tudo iria mudar. Houve um que até se declarou a uma rapariga durante as filmagens do programa, embora não tenha sido correspondido. Mas logo afirmou que depois da plástica feita ela pensaria de maneira diferente. Houve ainda tempo para cenas das várias operações feitas: nariz, queixo, maças do rosto, dentes. E finalmente o resultado. Eles pareciam felizes com a mudança, contentes, optimistas quanto ao futuro junto das raparigas e pensando até em seguir uma carreira de modelos. A ideia de Belo, em Platão, está intimamente relacionada com o amor, sendo o Belo sempre de natureza espiritual, estando unido às virtudes morais. Mas nos dias de hoje pouco resta dessa ideia. Todos os dias somos bombardeados com novas dietas, produtos de beleza, novos exercícios que irão impedir que a barriga cresça desmesuradamente, e se não houver dinheiro para pagar tudo isso há o crédito em prime time. O que interessa não é o Belo platónico, é o ter estilo, pois Platão nunca teve que fazer o secundário numa escola onde toda a gente tem um Ipod ou um leitor de Mp3 ou um telemóvel topo de gama, nunca teve que beber cinco shots seguidos de uma bebida com mais de 38º de teor alcoólico para ser aceite no grupo, e nunca foi rejeitado por ter o nariz grande, os dentes tortos, acne. Ah! mais uma coisa: a rapariga, mesmo depois de feita a plástica, disse que não. Mas ele continuou a parecer feliz.

6 comentários:

António Godinho Gil disse...

Se calhar, ela preferia o Di Caprio...Bem visto, Manuel. Sobre o assunto, existe um excelente texto, em espanhol, de Javier Crux, intitulado "Las estrías de la belleza en occidente", que convido à leitura.Está em http://www.mysterywebmagazine.com/lecturas/javiercrux02.htm

MJLF disse...

A beleza e o amor são elementos mediadores entre dois mundos para Platão, são fenomenos também terrenos e corporais, mas que nos remetem sempre para o mundo inteligivel, que nos provocam sensações fortes devido ao reconhecimento, têm uma forte componente espiritual. Quando à associação com as virtudes morais, muito do que se pensa sobre isso deriva das intrepretaçãos que o cristianismo fez de platão, atenção, não confundir Platão com os platonistas. Os gregos tiveram canones de representação do corpo humano, assim como quase todas as culturas, os cannones gregos de beleza no periodo clássico baseavam-se na geometria, em estruturas abstratas e equilibradas. No Helenismo já existem representações mais naturalistas, e são mais expressivas, em vez do equilibrio geométrico temos as tensões da assimetria. O problema dos actuais cannones de beleza que nos são impostos através dos media é a sua ausência de conteudo, é o facto de serem vazios, de não remeterem absolutamente para nada. Eles servem para deixar as pessoas frustadas, insatisfeitas e leva-las a consumir mais, são formas de manipulação das pessoas.
Maria João

Anónimo disse...

godinho: vou seguir o teu conselho de leitura.

maria joão: concordo contigo. em relação a Platão, talvez as minhas fontes não estejam muito correctas. tenho que verificar.

MJLF disse...

Manuel: só estou a chamar a atenção para o facto da cultura judaico-cristão onde estamos inseridos ter intrepretado Platão, é claro que a estética e a etica estão de mãos dadas em Platão, mas as virtudes morais dos gregos não coincidem com as da cultura judaico cristã. Por exemplo: na Grécia, a pedastria estava instituida, era prestigiante para os amantes ( homens de meia idade pretencentes às familias aristrocráticas de Antenas) terem relacionamento com os amados ( jovens atletas belos, que frequentavam os banhos publicos, que não eram efeminados, atenção, mas só tinham interesse até lhes crescer a barba, ou seja, até cumprirem os seus 14 anos). No Fedro é possível ver como o amor é uma forma de elevação,devido à componente espiritual , até mesmo nessa situação que aos nossos olhos nos parece reprovável - hoje em dia isso seria considerado pedofilia, um horror. Socrates aconselha os amantes a terem um papel pedagógico em relação aos jovens amados belos, em vez de os subjugarem e se deixarem levar por práticas desrregradas, é muito bonito este diálogo, sobretudo a parte delirante sobre as asas que crescem na alma, quando contemplam a beleza(uma boa metafora para a ereção masculina). Só o amor faz a verdadeira CRITICA DE VALORES.
Maria João

Anónimo disse...

eu entendi, maria joão. mas de facto devo aqui dizer que sinceramente eu não sabia que os platonistas tinham feito uma interpretação de platão à maneira deles. dei filosofia há algum tempo e só agora é que comecei a relembrá-la e ainda não cheguei aos platonistas.

quanto à pedastria... já no século XX André Gide defendeu-a e até Jean-Paul Sartre o fez, se não estou enganado. isso de ser crime é uma coisa relativamente recente. foram condenados mais cedo os homossexuais do que os pedófilos. é estranho, mas é verdade

André Moura e Cunha disse...

Caro Manuel,
Se tiveres tempo e paciência lê este texto que escrevi no falecido Porque a propósito da beleza em Platão, através dos diálogos de Sócrates com o jovem Fedro. E isto tudo a propósito do divinal romance Morte em Veneza de Mann e imortalizado por Visconti em filme.
Um abraço,
André