Duas pequenas notas e não volto mais a estes assuntos (27)


1. Muitos são aqueles que estão indignados com o fim dos "chumbos", ou reprovações, ou retenções, no ensino básico. Não sei se essas mesmas pessoas conhecem os vários decretos-lei que regem tal figura. A retenção de um aluno, dentro do ciclo que o aluno frequenta, há muito que é uma medida de carácter excepcional. A reprovação em final de ciclo obedece a regras estabelecidas. Mas existe. Assim sendo, não é totalmente verdade que os "chumbos", ou reprovações, ou retenções, vão terminar. Depende muito daquilo que um professor titular (no caso do primeiro ciclo) entenda, ou o conselho de turma (nos restantes ciclos). Há, sem dúvida, uma pressão dissimulada do Ministério da Educação para que o maior número de alunos transite de ano (temos de fazer boa figura nos relatórios da OCDE, verdade?). Há pressão de certos Directores de Escola para que os alunos transitem de ano e exista o menor número de "chumbos" (é um pouco ingrato, mas a verdade é esta: uma escola com poucos "chumbos" é uma escola que tem mais hipóteses de receber mais alunos; um maior número de alunos garante o lugar a professores e a auxiliares. É a economia a funcionar. Ou melhor: é o capitalismo selvagem a funcionar). Digo isto com conhecimento de causa: já assisti a reuniões onde, entre-linhas, é dito mais ou menos isto: "se existirem muitos alunos a chumbar os pais não colocam cá os filhos e vão para outra escola, deste modo vamos perder turmas; se perdermos turmas perdemos crédito horário e se perdermos crédito horário não há lugar para todos". E, caríssimos, a verdade (em última análise) é esta. Por muito má que nos possa parecer.

2. A principal questão, no meio disto tudo, é que a maior parte das pessoas não acredita, não confia nos professores que existem. Estes foram, durante anos, vexados, humilhados e tratados como incapazes naquilo que fazem. Sempre se ouviu dizer: "não sabes fazer nada: vai dar aulas". Mas agora o Ministério da Educação diz que vai ajudar os alunos com mais dificuldades académicas. Só que não diz como. Vai colocar mais professores nas escolas? Se sim: onde estão eles? É público: há falta de professores. Vai utilizar os professores existentes? Os mesmos que foram vexados, humilhados,  tratados como incapazes e que agora estão mais velhos, cansados, sobrecarregados com turmas numerosas (o limite mínimo são, neste momento, vinte e seis alunos por turma) e desmotivados devido a anos de congelamento nas carreiras? O Ministério da Educação e os seus responsáveis têm sempre ideias muito brilhantes e muito boas. Mas são os professores, no terreno (como é costume dizer) que têm de "descalçar a bota", pois têm a "autonomia" que alguns andaram a reivindicar durante anos (ainda um dia haverá um estudo sobre o nefasto que é e foi a "autonomia escolar"). Só que a bota está muito apertada. E todos nós sabemos o que nos apetece fazer quando uma bota nos fica muito apertada.  

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