Olhai que quem quer comer
trabalha, lida e trabuca;
que quem trabuca manduca,
mil vezes ouvi dizer;
mas ociosos viver
e vir comer pão alheio
é um caso muito feio;
como quem sua e trabalha,
beba quem na eira malha,
ao sol e calma, o centeio.
Mas, se a vós sem trabalhar
comer meu pão vos alegra,
olhai que algum dia a negra
me podeis vir a pagar;
porque nem sempre há-de estar
o Diabo atrás da porta;
porque, se a fortuna torta
bigorna agora me fez,
posso ser malho outra vez
e assim vingar-me importa.
António Serrão de Castro, Os Ratos da Inquisição seguido de A Francisco de Mezas, prefácio de Camilo Castelo Branco, Lisboa: Frenesi, 2004, p. 71.
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