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Excepto um dia, o despertador toca sempre às 06h30. E, geralmente, às 22h estou na cama. Tento ler um pouco, o que muita vez não é possível, tal o peso nos olhos . Fez ontem um mês que as aulas começaram e o meu corpo começa a dar sinal. Os alunos têm, até agora, colaborado bastante para que as aulas decorram com normalidade. Mas o ruído na sala dos professores é atroz e evito, a maior parte das vezes, passar lá os curtos intervalos. Vou apenas buscar o necessário café e dirijo-me logo para a próxima sala de aula, onde procuro o silêncio impossível, tendo em conta que me encontro numa escola. Às vezes penso se não seria melhor para mim trabalhar noutro lugar. Ter outra profissão. É o meu vigésimo ano lectivo e começo a ficar cansado. E mais cansado fico ao pensar que ainda me faltam mais vinte anos disto (na melhor das hipóteses).
     Não posso esquecer que dezoito dos vinte anos foram feitos de norte a sul do país, desde Ponte de Lima até Silves. Fiz quilómetros suficientes para várias voltas ao mundo. A única e significante vantagem é o facto de conhecer o país como poucos conhecem. Às vezes leio coisas nos jornais e desato a rir, principalmente quando vem aquela malta falar da qualidade de vida do "Portugal profundo": esse "país real". Vi mais "país real" no Cacém, em Alapraia, em Caxias, na Alta de Lisboa, do que na Pampilhosa da Serra, em São Teotónio, ou em Arcozelo (Ponte de Lima). O "país real", que muitos cronistas desta nação apregoam, é o país que eles visitam ao fim-de-semana, para fugir da realidade da cidade. É o país atrasado, de antanho e salazarento. E, agora que penso melhor, talvez os cronistas gostem desse país assim, onde os tratam por Senhor Doutor, ou Senhor Engenheiro, porque na cidade são quase  tão anónimos como os rostos daqueles que todos os dias apanham o comboio da linha de Sintra. E é disso que eles não gostam: estarem ao mesmo nível desses outros. Daí falarem do "país real". 

1 comentário:

Gato Aurélio disse...

...o país torna-se muito giro e very typical aos fins de semana e períodos curtos de férias... por outro lado, o isolamento e a solidão do very typical dos outros 360 dias já são outros quinhentos...