A noite: lá fora. Vergílio Ferreira começa "Invocação ao meu corpo" a invocar, em primeiro lugar, a noite. Depois, sim, vem tudo o resto. No seu extremo individualismo, na linha que traçou, cedo descobriu que o caminho é feito a caminhar sozinho, pois é difícil arranjar quem ande a nosso lado quando a escolha é tão radical. E quando alguns que se diziam de esquerda o acusaram de ser de direita, não ficou preocupado, pois sabia que alguns que se diziam de direita o acusariam de ser de esquerda. Assim, sabia também que estava no lugar que tinha escolhido para si e que era o lugar de sempre. Em literatura aconteceu-lhe o mesmo. E a sua conclusão foi a mesma também. Concluo, agora que é noite, que também eu estou no lugar que escolhi para mim. Nada nem ninguém escolheu por mim. Sou aquele que sempre fui. Continuo no mesmo lugar de sempre. Há quem me veja de costas, num dia; depois de frente, noutro dia; e a seguir vê-me à sua esquerda e ainda à sua direita. E dizem que mudei. Mas estou sempre no lugar de sempre, que escolhi. Eles é que se movimentam.
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