Passou mais um
dia. Vim a um café diferente, do lado mais fino da Alta de Lisboa (nome pomposo
dado à Musgueira). Aqui os clientes vestem bem e chegam nos seus bms e
mercedes. Pedem o que têm a pedir e não fazem conversa. A verdade é que os
condomínios de luxo começam a cercar o bairro. Mais cedo, ou mais tarde, o
bairro irá ficar cercado de grandes prédios. Soube ontem que já há quem esteja
a ser indemnizado para ir embora, para abandonar as casas que, certamente, irão
ser demolidas. É um processo que está a decorrer lentamente, mas que irá ter,
de certeza, o desfecho há muito esperado: a expulsão daqueles que aqui moram.
Expulsar todos aqueles que são uma “ameaça” e vivem “à conta” do rendimento de
reinserção social. Expulsar todos aqueles que podem tornar a vida aqui “desconfortável”.
O passo final, acredito, será o encerramento da escola. Daí o não haver
investimento, requalificação. A escola está condenada a desaparecer em nome da “higiene
social”. Na mesa ao lado
todos se cumprimentam apenas com um beijo. Falam dos filhos, do pouco agasalho ao
sair de casa. Criticam a nova moda de “andar à chuva e sem o anoraque”, ouço
alguém dizer num tom muito afectado e com aquele sotaque ridículo de quem julga
ser upper class. Lamentam a chuva que
dura há tanto. Riem. Comem torradas e bebem sumo de laranja natural. Estão
despreocupados com o trânsito ou com o chegar a horas ao escritório. Os filhos,
de certeza, foram a pé até ao colégio que fica ali ao fundo da rua, nada
agasalhados e pouco preparados para a chuva que “vem depois da uma”.
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