Fernando Guerreiro


Escrevemos sempre de costas voltadas
para a morte, à espera que as palavras
se desprendam das ogivas do silêncio,
iludidas com o cenário que o mundo
compõe com os restos da aventura.
Vindas de dentro não é de estranhar
que sejam de dor os sentimentos,
recortados na espessura da ideia
a que o convívio com os deuses
comunicou num sentido devoluto.
Talvez por isso desaparecem
na paisagem, desenhando
com flores promessas que
cabe ao vivos cumprir
pelos caminhos que os trazem
de novo aos redis sublimes
do destino. Não é assim
também que se escreve?,
de dentro de um cemitério
de sonhos a que só o pavor
dos homens dá o rótulo
entediado da literatura?


em Caminhos de Guia, Lisboa: Black Son Editores, 2002, p. 11.

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