Nota de leitura (5)


10

Depois das 7
as montras são mais íntimas

A vergonha de não comprar
não existe
e a tristeza de não ter
é só nossa

E a luz torna mais belo
e mais útil
cada objecto


António Reis
Poemas Quotidianos (1957)
em Poemas Portugueses
Antologia da Poesia Portuguesa
do Séc. XIII ao Séc. XXI
Porto Editora, 2009, p. 1522.



António Reis é o exemplo quase prefeito da abolição quase completa daquilo que poderão ser as mais variadas interpretações do leitor. Os seus poemas, despidos de qualquer artificialismo bacoco, revelam uma simplicidade desarmante. O poema acima transcrito é disso um bom exemplo: versos curtos, limpos; um limitado uso de adjectivos; recusa da metáfora mirabolante que nada acrescente e obriga o leitor a procurar num dicionário o significado de algumas palavras. Tal como nos seus filmes (veja-se, a título de exemplo Jaime), a poesia de António Reis vai ao encontro do essencial, deixando para outros a arte dos rodriguinhos.

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