Um poema de D. Francisco Manuel de Melo


Cada um é fado de si mesmo

Mas aonde irei eu que este não seja,
Se a causa deste ser levo comigo?
E se eu próprio me perco e me persigo,
Quem será que me poupe ou que me reja?

Porque me hei-de queixar do Tempo e Inveja,
Se eu a quis mais fiel ou mais amigo?
Fui deixado em mi mesmo por castigo:
Triste serei enquanto em mi me veja.

Esta empresa que me mi tanto em vão tomo,
Esta sorte que em mi seu dano ensaia,
Esta dor que minha alma em mi cativa,

Vós só podeis mudar. Mas isto como?
Como? Fazendo que a minha alma saia
De mi, Senhora, e dentro de vós viva.

em Obras Métricas, Parte II, In D. Francisco Manuel de Melo: Poesias Escolhidas, prefácio, selecção, notas, tábua de concordância e glossário por J.V. de Pina Martins, Lisboa: Verbo Edições, 1969, retirado de História e Antologia da Literatura Portuguesa - Século XVII, nº 31, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, p.32.