Um poema de Henri Michaux


Levem-me

Levem-me numa caravela,
Numa velha e doce caravela,
Na roda de proa, ou, se quiserem, na espuma,
E percam-me ao longe, ao longe.

Na esteira duma outra idade.
No veludo enganador da neve.
No bafo de alguns cães reunidos.
No exército exausto das folhas mortas.

Levem-me sem me quebrar, por entre beijos,
Nos peitos que arfam e respiram,
Nos tapetes das palmas das mãos e seus sorrisos,
Nos corredores dos ossos compridos e das articulações.

Levem-me, ou antes, escondam-me.



em As Minhas Propriedades, tradução de José Carlos González, Lisboa: Fenda, 1ª edição, 1998, p. 78.

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