Um poema de António Ferreira


Dos mais fermosos olhos, mais fermoso
Rosto, qu'entre nós há; do mais divino
Lume, mais branca neve, ouro mais fino,
Mais doce fala, riso mais gracioso;
D'um angélico ar, de um amoroso
Meneo, de um espírito peregrino,
S'acendeo em mim o fogo, de qu'indino
Me sinto, e tanto mais assi ditoso.
Não cabe em mim tal bemaventurança.
É pouco ũa alma só, pouca ũa vida.
Quem tivesse que dar mais a tal fogo!
Contente, a alma dos olhos ágoa lança
Polo em si mais deter; ma é vencida
Do doce ardor, que não obdece a rogo.

em Textos Literários - Século XVI, (org.) Beatriz Mendes Paula e M. Ema Tarracha Ferreira, selecta organizada de acordo com o programa oficial do VI ano dos Liceus, Lisboa: Editorial Aster, 3ª edição corrigida e aumentada, 1975, p. 391

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