Um poema de João Damasceno


Sentado próximo de um cadáver,
como uma perna de galinha

As carnes muito brancas,
os olhos muito abertos,
a língua dura e roxa,
o céu da boca azul:
não parece já, apetecer-lhe almoço

Passei à sobremesa,
em óptima melancia enterro o meu dente;
com a língua dou um estalo
o sabor é excelente

Daquele corpo pútrido,
o cheiro já mal aguento;
cuspo uma pevide,
acerto-lhe no ventre

Ainda estou para entender,
da morte, esta alquimia:
quando a sento à minha mesa,
a galinha sabe a faisão
e a melancia duplamente a melancia

em Sião, organização e notas de Al Berto, Paulo da Costa Domingos e Rui Baião, Lisboa: Frenesi, 1985, p. 2001.

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