Duas pequenas notas e não volto mais a estes assuntos (4)


1. Quando alguém se refere a uma determinada obra (romance, novela, conto, poesia) como grande literatura, está consciente do risco que corre ao utilizar o adjectivo. Mas, não é menor o risco se alguém se referir a essa mesma obra como literatura. Afinal, o que é literatura? Esta é uma questão que está longe de obter uma resposta que a todos agrade. E ainda bem que assim acontece, pois se existisse consenso estaríamos, à partida, a delimitar algo que, quanto a mim, não deve ser delimitado. O conceito literatura deve ser um conceito aberto. Se ele for de alguma forma delimitado, ou tiver como referência o cânone, estaremos a colocar de parte uma infinidade de possibilidades.

2. Na minha opinião, o cânone é o maior inimigo da literatura. Como pode algo tão sujeito à subjectividade inerente ao Homem definir ou estabelecer limites? Como pode algo – ou alguém – dizer o que é ou o que não é literatura, o que está ou não está dentro dos limites da literatura? Como podem ser estabelecidos limites a algo que tem como característica (para ser verdadeiramente original) a transgressão? Só aceito limites se estes forem criados com um único objectivo: serem violados. Estou consciente que o cânone não é uma entidade estática e que as vanguardas muito fizeram para o destruir – apesar de estarem esgotadas. No entanto, querer estabelecer um cânone, ou a ele regressar, só poderá ter um único objectivo: restringir ao máximo o “uso” da literatura a uma série de “iluminados”. E isso eu não posso aceitar.

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