Medula


O livro Estalagem (Medula, 2019), de Henrique Manuel Bento Fialho, tem recensão crítica de José Ricardo Nunes no último número da Colóquio Letras (Setembro/Dezembro 2020). O livro ainda se encontra disponível para venda.   

Estalagem reúne 36 poemas, quase todos compostos por estrofes de quatro versos e, maioritariamente, constituídos por três estrofes. Esta regularidade, longe de ser absoluta, é acompanhada pelo tendencial recurso ao decassílabo, embora também esta medida surja apenas como referência, sendo frequentemente desrespeitada. Estamos aqui, talvez, perante uma provocação, em que uma norma (uma possibilidade, uma aparência de norma) é apresentada para poder ser desrespeitada e subvertida num exercício que não é ostensivo mas se alimenta de pequenas infracções e rupturas que minam o discurso poético e tornam num exercício de pluralidade, impossível de reduzir. A norma torna-se o desprezo pela norma, afirma-se a virtualidade do plural e do divergente. Neste sentido, o último verso do livro, que o interrompe abruptamente — excepcional pela mais curta medida — concretiza o programa enunciado na epígrafe e dá consumação a esta estratégia. Ficamos repentinamente como que sem solo sob os pés. Mais do que ensinar a cair, o poema conduz efectivamente à queda, proporciona-nos a experiência da queda, empurra-nos para o abismo, aponta ao vazio da sua própria destruição.
 
Colóquio LetrasFundação Calouste Gulbenkian, Setembro/Dezembro 2020, pp. 241-243.

Sem comentários: