Um poema de Rainer Maria Rilke


Aí, há homens que vivem, pálidos, sem cor,
e morrem sem saber por que sofreram.
E nenhum deles vê o pobre trejeito
que ao fim de noites sem nome veio substituir
o sorriso feliz de um povo meigo.

Vão ao acaso, aviltados pelo esforço
de servirem sem ânimo coisas sem sentido,
as roupas vão-lhes ficando mais lassas
e as suas lindas mãos depressa envelhecem.

A multidão empurra-os e passa indiferente,
embora eles sejam fracos e hesitantes,
apenas amedrontados cães vadios
os seguem alguns momentos em silêncio.

Sujeitos aos caprichos de um milhar de algozes
e agradecidos pelo gongo de cada hora,
erram, solitários, em torno dos hospitais
aguardando aflitos o dia da entrada.


em O Livro da Pobreza e da Morte, tradução de Ana Diogo e Rui Caeiro, Lisboa: Livraria Snob, 3ª edição revista, 2019, p. 23.

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