João Barrento




A morte livre é a morte leve.
Os objectos e os «bens» (estranho termo), as coisas e as casas, as posses e as riquezas, pesam sobre a eventual decisão da morte livre, atravancam o caminho até ela. Esse lastro exterior, de passados mortos e de um presente não vivido, tolhe os movimentos e pesa sobre corpo e alma. Como podem um corpo preso e uma alma que não voa estar disponíveis?
A morte livre precisa de alma leve e casa limpa para preparar a partida. O seu caminho é o de uma alameda de luzes, mais que os corredores escuros em que se perde, tropeça, hesita. Se possível, entre ramos despidos, e a queda no Nada como horizonte.


em Como um hiato na respiração – diário do dia seguinte, Lisboa: Averno, 2015, pp. 41 e 43.

1 comentário:

bea disse...

Talvez eu esteja errada, mas a proximidade da morte natural, digo se ocorre na velhice, despoja-nos desses ditos "bens" materiais. Por perderem efeito, julgo. Não sei se se pode chamar-lhe morte livre, mas é seguramente uma morte liberta.

Porém, essa atitude despojada que pode existir em qualquer idade. Depende apenas do ser de cada um.