para Rute Castro
O gato dorme o sono dos gatos na cadeira que ele escolheu e que, assim, lhe ficou destinada. Está enroscado sobre si mesmo, como só os gatos fazem. Esconde o focinho. Talvez tenha frio, apesar do aquecedor ligado. A meia luz do candeeiro de pé ilumina os cantos da sala com sombras. Tens um livro de contos aberto sobre a mesinha. Lês: Dentro da casa ouvia-se sempre o mar*: mas aqui o mar é apenas a marulhada de carros na via-rápida, lá ao fundo. O prédio, a esta hora, está em silêncio. Avanças: Pelo fim da tarde levantava-se uma aragem de sul que invertia o trânsito das embarcações e as fazia regressar*: e sabes que os regressos são sempre esperados, que esperam por ti. Por ti — que nunca partiste.
* Alexandre Sarrazola, Neófitos, Lisboa: Averno, 2014, p. 45 e p. 57.
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