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Poeta pouco dado ao convívio mediático, Carlos Luís Bessa é, por isso, muito pouco conhecido. E, digo eu, ainda bem. Publicado em 2000, Lançam-se os Músculos em Brutal Oficina é um livro de poemas onde a tão badalada realidade é mote para o dizer: Esta apólice, o vizinho de cima/A puxar o autoclismo/A bater na mulher e nos filhos//A água da torneira com cheiro a lexívia/Sempre a pingar/O televisor com uma avaria//Talvez o canteiro das flores/Sujas e mal tratadas/Estas zangas por tudo e por nada. (p.27). Carlos Luís Bessa tem, como poucos, a capacidade de dizer aquilo que, para muitos — defensores do sublime e das rezas ao altar-mor onde colocam a poesia —, é indizível: Todos os dias as chaves de casa/Do automóvel, do cacifo. Esta sala este/Quarto de banho branco e azul.//Levanta-se a pala do correio/Para que o dia, para que a luz/Mas a casa como uma ilha//O sustenido da sobrevivência/A sobrevivência em sustenido. (p. 35). 

5 comentários:

Jorge Melícias disse...

Tens toda a razão, Manuel. O lugar da poesia é na casa de banho ("branca e azul", com motivos florais ou cornucópias estivais), ao lado do piaçaba e dos vários tomos da obra do padre António Vieira. Dá sempre jeito ter papel à mão nestas ocasiões e a avaliar pela cagada que incensas acima um só volume seria pouco.

manuel a. domingos disse...

Caro Jorge:

O teu comentário é publicado porque te identificas e porque o tom é, definitivamente, o teu, principalmente quando se elogia alguém, ou um livro, que não pertence à tua "escola" ou "visão" poética.

Como é óbvio: respeito a tua opinião, que é tua e a ti ficará associada.

Cumprimentos

Jorge Melícias disse...

Caro Manuel,


E porque razão eu não haveria de me identificar? Medo? Pudor em ferir susceptibilidades? Sim, é a minha opinião e só a mim está associada. Mais alguma redundância?

manuel a. domingos disse...

Jorge:

ainda bem que assinas sempre. É uma característica que em ti aprecio.

Claro que sei que não tens qualquer pudor em ferir susceptilidades, nem sequer medo.

Mas redundantes começam a ser os teus comentários a alguns determinados tipos de textos que por aí são publicados.

Abraço

Jorge Melícias disse...

Manuel:


O que tu não entendeste ou fizeste que não entendeste é que o poema citado veio na correnteza. Se ele ilustra na perfeição a minha perplexidade em relação ao facto de alguém ter finalmente descoberto a pólvora molhada, a verdade é que nada tenho a ver com isso. Aí os créditos vão direitinhos para o autor.

O que suscitou o meu comentário (é aliás por aí que ele começa) foi o tom sapiencial e assertivo do teu apartezinho, como se tu e mais uns quantos iluminados tivessem finalmente resolvido a questão do "lugar da poesia" e, pasme-se, "a montanha tivesse parido um rato".

Se tu tens todo o direito (d'abord porque o boteco é teu) de, movido por uma incontida alegria, transvazares a magnificência do teu achado, permite também (seguindo o teu espírito democrático e a pluralidade de vozes que tanto advogas) que um rapaz confuso como eu exerça o seu direito à incredulidade.

Abraço,